Morte numa rua de Aveiro

 

Noite cerrada em Aveiro. Num bairro degradado, à mercê de insaciáveis especuladores imobiliários. Numa rua estreita com duas faixas de rodagem. No passeio oposto ao sentido do trânsito ascendente, jaz um homem, de barriga para baixo, voltado para a frente, para o lado descendente da faixa de rodagem. Soube-se depois que se chamava Albino com mais de sessenta anos, um homem só, um dos habitantes do pequeno bairro.
Sendo tu o inspector principal, chegas ao local e estão dois homens a rodear o corpo da vítima.
O mais jovem, com cerca de 30 anos, Bernardo, foi o primeiro a ver o cadáver. Afirma ele que quando subia a rua viu passar um carro em grande velocidade, que quase se despistou por derrapagem na pequena curva da rua, fazendo-se ouvir logo de seguida um tiro. Apesar do susto, correu em direcção ao sítio de onde surgira o som do disparo. Diz que ficou pasmado quando viu o homem caído. Não teve reacção para nada. Ficou ali quedo e mudo, até que chegou o segundo homem.
Foi este, com perto de 40 anos, João, que telefonou para a polícia. Diz que vinha a descer a rua quando ouviu um barulho que não identificou logo como som de arma de fogo. Confirma que passou por ele um carro, veloz, com dois rapazes e suas namoradas trocando beijos ardentes, num passeio de automóvel demasiado apressado para a segurança de quem ambiciona viver mais para além daquelas horas felizes.
Quando João chegou junto da vítima já lá se encontrava Bernardo, completamente paralisado por um pânico tal, que lhe provocou um mal-estar tão violento ao ponto de ter uma crise de vómitos. Felizmente, o pequeno chafariz ali existente por perto permitiu que bebesse um gole de água, que o acalmaria, e refrescar-se, na cara e nas mãos. João afirma que também não mexeu em nada.
A arma do crime está caída junto ao cadáver, na berma do passeio. A cápsula está perto do corpo, cerca de dois metros mais abaixo. Nas costas do morto é perfeitamente visível um buraco por onde saiu a bala fatal, que acabaria por se alojar junto à valeta do passeio do lado direito do sentido ascendente da rua. A arma não tem quaisquer impressões digitais. No peito da vítima, mesmo junto ao coração, existem queimaduras provocadas pelo tiro e resíduos de pólvora. As suas mãos nuas apresentam luxações causadas pela queda, contrastando com as muito bem tratadas e limpas mãos dos dois homens que o “velaram” até à tua chegada.
A cabeça do morto exibe um hematoma, aparentemente grave, que, naturalmente, já não lhe dói, em contraste com a tua cabeça, que lateja de tanto pensar sobre qual das quatro hipóteses corresponde à forma como ocorreu a morte do velho Albino (apresentando uma justificação válida):

A – Arménio (Sr. Albino) suicidou-se, por solidão, desespero e depressão.
B – Bernardo matou o velho, por qualquer razão desconhecida.
C – Carlos era um dos ocupantes do carro, de onde foi disparado o tiro, e voltou ao local do crime para se certificar da morte de Arménio.
D – Um dos jovens do automóvel disparou sobre o velho e atirou a arma para junto do cadáver, pondo-se de seguida em fuga acelerada.